sábado, 28 de fevereiro de 2009

"We are each other's keepers"

Fecho o pc portátil nos joelhos. Esfrego os olhos de cansaço ao mesmo tempo que me rio para dentro enquanto me lembro das figuras tristes que fazemos nas fotos que acabei de passar para o computador... 'Só esta gente para me fazer usar um barrete de Pai Natal em plena Baixa Lisboeta a meio de Fevereiro!', penso enquanto me levanto para desentorpecer as pernas.

Já de pé, varro o quarto com os olhos. A Bayley e a Rita tinham chegado da sua volta nocturna há pouco ('O que é que esta gente anda a fazer a vaguear nos corredores a estas horas? Tsc tsc...', tinha eu comentado com uma careta quando as vi entrar no quarto) mas já ambas suspiravam, cada uma no sono, qual delas a mais barulhenta.

Reparando que a cama da Laura estava vazia, reprimo um suspiro meio irritado por sentir que não conseguia tomar bem conta dela nestas alturas em que ela teima em pensar que é capaz de fazer tudo sozinha. 'Além disso, estava mesmo numa de rever a 6ª de Friends esta noite!', acrescento para mim própria com um meio sorriso.

Não tinha sono. Resolvi ir dar um passeio pelos corredores, talvez ainda alguém estivesse acordado. Claro que no piso dos rapazes tropeço nuns ténis deixados ao acaso no chão. '*+#%&, e ainda mais isto e mais isto e mais isto para os putos!!'. Reprimindo ainda mais uns quantos palavrões, tento levantar-me do chão o mais silenciosamente possível, enquanto decido nesse momento ir apanhar um bocado de ar à varanda.

'Mental note: amanhã dar um calduço ao puto Bruno pela tentativa de homicídio à minha pessoa!' Ao olhar para trás, tinha reconhecido os ténis All Star nº36 com chamas de lado.

Chego à sala 28 e pouso a mão na maçaneta da portada que dá acesso à varanda. Mal faço o movimento de a abrir, um som ensurdecedor ouve-se de repente por todo o lado. Tenho de repente um flashback que envolve pessoas a saltar de janelas e uns estores brancos estragados.
'Merd*... Não acredito que me esqueci do novo alarme de segurança que o EVP instalou!!'

Atravesso a sala a correr e quase me espeto contra a parede enquanto abro à pressa a tampa do alarme. Só preciso do código para fazer calar aquela barulheira. 'Não acredito... Era a data de nascimento da Dona Almerinda, como é que eu não me lembro?!?"
Dois eternos segundos de indecisão depois lá me lembro dos quatro dígitos ('Se a Dona Almerinda sonha disto, mata-me!') e segundos depois de os inserir no teclado do alarme apercebo-me com um suspiro de que o que se ouve agora é apenas aquele zumbido na minha cabeça.

'Man... Espero que esta gente tenha toda um sono muuuiiito pesado...' Rio-me para dentro sabendo que não é verdade, pois lembrava-me de um episódio caricato deste género ocorrido na viagem à Escócia.

Abro finalmente a portada da varanda de par em par e uma brisa de ar fresco bate-me na cara.

'Bem, só falta mesmo estares toda vestida de branco para poderes gritar "Aqui vou ser feliz!!", como no anúncio... Eheheh...' Olho para trás, à procura da fonte desta voz masculina que me é tão familiar. O Francisco devolve-me o olhar do outro lado da sala, ensonado.

'Oh pá desculpa, acordei-te com aquela chinfrineira toda?', pergunto-lhe com um ar aflito.

'Não, mas pensei que era o circo a chegar à cidade...'

Sorrio, reconfortada. O IGL não seria o IGL se eu não chegasse atrasada a 70% das aulas de ATC, e se o Francisco não tivesse sempre uma piada para dizer.

Aproximando-se de mim e da varanda, continua: 'Passei agora na sala de alunos, tive de ir à casa de banho. Trouxe-te o teu maço de tabaco, deixaste-o em cima da mesa... Já sabes que isso não é nada fixe para os putos, olha os exemplos...'
Sorrio, envergonhada. Realmente é um erro crasso, não posso esquecer-me da próxima vez.

Enquanto me estende o maço, o Francisco olha para mim com aquele seu sorriso malandro e acrescenta: 'E olha o que eu também descobri...' E de trás das costas tira duas sandes de Nutella ('do Pingo Doce', presumi rapidamente) com um aspecto divinal. 'Eram para a Laura, acho eu, mas... Pá, eu tava com fome, e ir até ao bar... Nah!'

O meu sorriso abre-se ainda mais. Enquanto nos sentamos no chão da varanda e pegamos cada um na sua sandes, olho para ele com um ar meio-reprovador-meio-brincalhão: 'Mas amanhã de manhãzinha acordamos mais cedo para fazer outras para a Laura!' Ele confirma com um aceno de cabeça e um sorriso, os dentes já cobertos de chocolate.

Enquanto mastigamos calmamente, não consigo deixar de pensar no que esta gente, este sítio, estas pessoas e toda esta música fizeram por mim ao longo da última metade da minha vida... 'Não seria, sem dúvida, metade da pessoa que sou se a minha querida mãezinha não me tivesse obrigado a continuar aqui quando eu quis desistir no 3º ou 4º grau', penso.
"Ainda me vais agradecer um dia...", tinha-me ela dito nessa altura... Realmente, não podia estar mais de acordo.

Lembrando-me de repente, olho para o relógio, já passa da meia noite há seculos! Estupidamente dou uma cotovelada no braço do Francisco, dando-me a mim própria mais uns segundos para engolir aquela última dentada.

'Hey... Já é dia 1, parabéns!!' O sorriso e o olhar de gratidão dele naquele momento valem o mundo, penso enquanto lhe dou um enorme abraço.

'Sabes', diz-me ele, ligeiramente emocionado enquanto se encosta de novo à parede, 'teoricamente temos uma vida inteira à nossa frente, não é? Mas são momentos como estes que a fazem valer a pena...' Mais uma vez, não podia estar mais de acordo.

3 comentários:

Jorge F. Rodrigues disse...

:)
e eu que o diga também: estive para desistir em 3 momentos ..
Depois de ler estes 4 textos, é impossível tirar o sorriso parvo que ostento.

Anónimo disse...

looool
" o sorriso parvo que ostento"..

Anónimo disse...

OOOOOH!